amor, do que sabemos sobre?
- Elis Barbosa
- 14 de jul. de 2024
- 4 min de leitura
sobre amor, sabemos do dito, mas o que foi mesmo que disseram? depende.
do que? do lugar de quem fala no mundo.
sabe aquela história do lugar de fala? pois então, se constrói a partir de determinado lugar no mundo em que se constitui a/o sujeita/o, e nesse processo posso então dizer, de onde falo, o que falta ou sobra.
esse mundo nosso tem sido compartilhado no masculino, como o uso formal da língua recomenda, mesmo que a vida seja muito maior que qualquer construção social/cultural, como a definição do que é formal ou informal no dizer das coisas.
quem é que determina o que é gíria e o que é de uso corrente da língua? tudo construção, nada é natural. aliás todo comportamento autômato em humanos costuma ter como efeito algumas restrições no engajamento desse sujeito na relação com o outro.
compartilhamos o mundo entre todas/es/os de maneira desigual, numa desigualdade desumanizadora de quem não harmoniza com determinado ideal que pactuamos, mas não em terceira pessoa do plural de verdade, não fomos nós, tu e eu, que pactuamos o binarismo masculino-feminino, menos ainda fomos nós que pactuamos o racismo, esse modo de organizar as permissões ou interditos do mundo são herdados. o que nos cabe porém, é decidir o que fazer com isso.
no meu mundo faz sentido a inclusão de todos, cada qual na sua singularidade, podendo fazer coletividade sempre que os singulares convergirem para um plural que nos seja comum. lembra do pertence/não pertence, está contido/não está contigo? digo, contido! a teoria dos conjuntos. nada fixo nem arbitrário para além do intangível que nosso querer já apresenta. Terei sempre motivos para querer o que quero, mas, quase sempre, nenhuma razão (razoável, racional, linear, que contemple as demandas da coerência). e tá tudo bem!
se nos prevalecemos das diferenças, entendendo o quanto elas ampliam as versões possíveis de nós a partir de todos esses outros diferentes de mim, podemos então, na integridade faltosa da minha subjetividade única, juntar, reunir, agrupar, aquilombar, sempre que convergimos em pontos a ponto de nos identificarmos e podermos ali tecer algum pertencimento respeitoso, não dogmático ou doutrinário. já temos a lei, tá bom já.
tenho observado o uso das diferenças produzindo restrições de acesso à vida e às suas melhores condições para determinados e certos grupos de gente em detrimento de outros, e olhando direitinho é possível perceber o lance da convergência. há situações que passam a configurar privilégio tamanha a diferença de tratamento oferecido de um grupo para outro, por exemplo a diferença de tratamento nos estabelecimento comerciais para mulheres negras e mulheres brancas.
mundo complexo esse “nosso”, todo segmentado, compartimentado, excludente, bolado lá atrás por um pessoal que projetou algo, mas deu nisso aqui. é assim mesmo, por mais que se planeje, elabore, defina, se escreva, tem sempre o inominável do real que invade e brinca de “seu mestre mandou”. gosto de brincar, porém, quando estou ganhando.
ficamos encalacrados com isso de dizer das coisas quando ignoramos que, sem saber, pode ser que as coisas é que nos digam. humanos falam, submetidos à linguagem que são. mas atente, linguagem não é só palavra falada por uma boca que diz, tem muito mais. fiquemos, porém, com essa equação, humanos, mesmo os que não falam, dizem do mundo o que dele se depreende, logo, precisamos saber de qual mundo se fala para nos localizarmos na cultura que o traduz e como isso marca as/os sujeitas/os.
quer ver? olha só esses dois livros sobre o amor, o primeiro que chegou até mim nessa vida foi O Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, de André Comte-Sponville, um filósofo materialista francês. Nesse livro ele vai defender a ideia de que dentre todas as grandes virtudes, a maior delas é o amor, e a “menor” digamos assim, é a que chegaria mais longe do amor, mas que ainda guardaria alguma semelhança com ele.
Tudo Sobre o Amor - novas perspectivas, chegou bem depois (uma demora terrível!), é de bell hooks, autora, professora, teórica feminista, artista e ativista antirracista estadunidense, ela nos convoca a pensar o amor ou o que dizemos que amar é, e quando praticamos o que dizemos que é amar, quais efeitos podemos verificar. isso tudo a partir da perspectiva de suas experiências e investigações pessoais, assim como das pessoas que à cercavam, se remetendo também à alguma literatura sobre o tema.
para ser imparcial na descrição dos autores coletei a primeira descrição deles que aparece na rede. André é adjetivado por “filósofo materialista francês” e bell, “autora, professora, teórica feminista, artista e ativista antirracista estadunidense”. aí te pergunto, então ele não é autor ou professor? Por que será que ela tem tantos adjetivos mais? Será que necessita deles para ter legitimada sua palavra? Se sim, por que André não?
Homem branco francês, mulher negra estadunidense. Definitivamente eles compartilham o planeta, mas não o mundo. Cada qual se faz a partir de lugares muito distintos.
Virtude, é a “qualidade do que se conforma com o considerado correto e desejável do ponto de vista da moral, da religião, do comportamento social etc.”, práticas amorosas para bell hooks não tem sustentação na moral, não são vividas na religião (aqui no Brasil a intolerância religiosa precisou virar crime para ter algum contorno), e olhando de pertinho o comportamento social não consigo apontar amorosidade significativa.
quer ver mais das diferenças a que me refiro, só dar uma olhadinha no índice de cada qual. falar pode ser caminho de cura, especialmente se houver escuta, qualquer que seja, mas a do inconsciente tem o seu poder, aprendi isso com a psicanálise. quer se a ver com o amor, acesse ele pela palavra escrita, falada, sentida, daquela que parou pra fazer um trilogia sobre o tema.
te prometo amplidão sem fim. quer falar de amor? vem fazer isso em grupo, amparado por um texto sobre o qual podemos debater profundamente, tocando o assunto com as luvas da filosofia de bell, tudo acessível, tudo inclusivo, bem cheio de sentimento e sentido. quer se a ver com o amor? cai pra cá, nosso grupo tem se mostrado seguro, acolhe(dor) e amoroso, bem do jeito que a gente gosta.
Abraço e até lá,
elis/barbosa

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